PARTE DE MINHA CARNE, DO QUE SOU...

A vida é frágil demais...

Não me canso de lembrar quantas vezes caí na infância, porque era muito gordinha e meus pés tropeçavam fácil. Vivia me ralando e chorava muito... Muito dengosa e bem mimada mesmo. Afinal de contas, criada pela avó e tia-avó, eu fui única neta e única sobrinha até os meus 14 anos de idade. Sete tios por parte de mãe; mãe solteira; milhares de primos mais velhos ou mais novos. Algumas vezes até me sentia fora da minha época... Tive uma infância riquíssima de acontecimentos... simples, valiosa e muito feliz!

Se essa rua fosse minha... Sim, a rua era minha! Era queimado, se duvidasse todos os dias. “Priscillaaaaaaaaaa vem jogar! Traz a sua bola pra gente brincar?!” Durante muitos anos, eu fui a única da minha rua que tinha uma bola, brinquedos da Estrela e que a mãe e os tios compravam presentes no Natal, pra mim e os meus amigos (carrinhos e bonecas). Minha família entendia o que era esperar o Noel e não ter nada debaixo da árvore de Natal. Foi assim que aprendi a importância de dividir e compartilhar o pouco que tinha, com aqueles que nunca tiveram nada. Foi assim que aprendi que o mais importante é o que nos faz verdadeiramente felizes – estar em família e sentir o amor incondicional!

Ontem completou 15 anos da maior perda da minha Vida! Ela foi, é e sempre será a pessoa mais importante desse Universo. Alguém que me ensinou o que é dignidade, lealdade, compaixão, verdade, justiça, coragem... Alguém que me faz até hoje não desistir da luta diária; que me faz erguer a cabeça a cada tombo; que me faz chorar, quando me lembro de sua cantoria comigo ao piano. Dou gargalhadas quando me lembro do seu grito fino na rua, como se estivesse me chamando pra tomar banho pra ir à escola, ou quando brigava porque eu gostava de jogar bola de gude com os meninos e pique - esconde, sumindo pelos arredores. Fico emocionada quando ouço Frank Sinatra, Ray Charles, a música “Anos Dourados”... Quando vejo um vidro de pimenta lembro-me bem de quantas vezes recebi o castigo de ter que passar na boca, por causa de soltar palavrões. Putz, como ardia!!! rsrs... E quando danço um bolero, uma valsa, lembro de como aprendi a bailar feito gente grande: ela fez uma boneca de pano, que batizei de Zina (personagem desengonçada e frágil, da novela da Rede Glogo, chamada Marrom Glacê – pronto... revelei o túnel do tempo e não escondi a idade. rsrs...). A boneca tinha um pedaço de madeira no seu corpo (tinha não... tem, pois a boneca ainda existe e a tenho no meu quarto, com meus ursinhos e o “Meu Bebê” – que revelação! Se algum psiquiatra ou psicólogo estiver lendo isso, por favor, não leve tão a serio as declarações. Kkk!). Dona Dorothy (minha avó), amarrava o corpo da boneca na minha cintura, os pés dela nos meus pés (a boneca tinha o meu tamanho) e depois eu subia nos pés de minha avó (junto com a boneca), pra seguir seus passos e o ritmo da música. Aos poucos ela me descia e eu bailava pela sala, toda boba com a minha parceira de dança. Meus tios se divertiam e a minhas amigas, vizinhos, também embarcavam nessa.

E quantos sacolés eu não roubei na geladeira, mesmo com a garganta ruim, pra comer debaixo do cobertor; também às escondidas sentada na janela, de virada de frente pra rua. rsrs... Ah, sacolé de coco. Que maravilha! Sei a receita até hoje!

Dorothy era surpreendente! Cheia de energia! Criou oito filhos, vários sobrinhos e dois netos, até onde o seu corpo e sua mente aguentou. Até que um dia partiu e deixou essa neta aqui com uma saudade absurda, mas consciente de que deixou muita dignidade, força e honra! Ela me deixou e foi sem medo! Medo este que também não tenho mais...

Obrigada por tudo, Doro! Vou te amar por toda a minha vida!!!

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